sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

*Axé procês*

Nóis aqui, fazemos questão de aprochegar e movimentar o mundão, direto da nossa várzea. Sem miséria, povo. Muito axé pra quem é de merecimento, quem é de consideração, e assim... junto todos num abraço e desejo:

"Todo o simples da vida".

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Rastilho da pólvora - em polvorosa

Rodamoinho roda roda, e eu rodo também... devo minhas divagações sobre a segunda divisão né? Já já... E as divagações de mesa de bar? Também, já já. No momento, coloco aqui dois escritos da Fê.

"Onde

Menina criada na ponta do dedo,

na ponta da faca,

dentro da saia, a saia a girar.

Dentro da menina, onde a mão não vai

a menina dança.

Dentro da menina, onde dói o amor

onde a mão não vai,

dentro da saia,

a saia a girar "





"A dinâmica lança uma partícula, põe em movimento um pouco d'água a cozinhar numa curva de rio. As partículas afunilam, vão se entrecortando até pingar, até encostar na terra do corpo.

O corpo procura uma beirada - porta de entrada avessa à conclusões. Faz um ar de graça, outro de desgraça. Procura um cigarro.

Quem tem a coragem de colorir o branco pálido da página. A coragem de penetrar outras cores, mais densas, mais escuras: ser penetrada. Ouvir só o coração, pulsando: coincidir consigo mesmo, depois abrir mão. A coragem de abrir a mão, cerrar o punho, atar o golpe. Ferir à faca, bala, bomba nuclear.

Fissurar um átomo.

O corpo procurando outro corpo, limite e motivo de todo querer bem. A coragem de descobrir um corpo negro, apontando pra expansão do universo. Esgueirar-se debaixo do cobertor dos séculos antes de tentar erguê-lo sem cuidado: há coisas que só se contam no escuro.

Descobrir uma pele negra, lisa e densa, como uma comunicação. Marcada, repisada- ressuscitada. O espectro dos séculos a rondar sua pretensão de clareza, de consciência. Porta (des)trancada, avessa à conclusões

Descobrir um buraco negro, uma mulher, o próprio ânus. Desmontar. Desabar as certezas sobre a terra do corpo, como quem pinga água."

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Último Adeus, pra nunca mais...

Óia, depois de escrever 8 páginas de prova sobre uns troços que eu
finjo que sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe, da insígne Política 4,
só digo o seguinte:

Vão pro inferno!!!

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Pros zóio da cobra verde

Tive certeza onde procurar e encontrei, tão fácil como as coisas são familiares aqui na Vila Indiana.
Mas só pra quem é.

Depois, uns tecos de história que refiz...
um muro que pulamos, um tombo no escadão
nossas ruas de ontem, ainda caminham os mesmos
agora com mais responsa, crescemos
uma montanha que escalamos, de roupas
um video-game pisado,
uma coca preta
um cinzeiro atolado.

Dia friozinho amanhecendo e um gosto de Sprite na boca. Tudo se encaminha de acordo com a vida que vai se desenrolando, nessa vida, sempre BNH. Mas é só pra quem é.
Seu João na rua caído canta um velho samba: "No tempo que eu tinha meu dinheiro, tinha meus companheiros, tinha tudo ao meu lado...", os pássaros também cantam. Cantei uma música uma vez, disso me lembrei. Contei meu dia.

-Se eu num lembro, eu não fiz! O que eu fiz? Fazer o quê, né!? Maloqueiro! Vagabundo nato!

Não sei como acordei com essa berma surrada do Timão, nem quando rabisquei esse desenho. Apostei coroa e perdi, por isso tô aqui. Levantei hoje foi reparando os olhos da cobra verde me encarando. Aninhando cabelo maciozinho e preto, mãos calejadas de maloca. Cheiro fresco de folha. E o chiclete de ontem engruvinhado na minha franja.

Pra quem é.

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

*Morada*

E como eu esparramasse
braços se abrindo em ânsia de crescença
por dentro de uma parede.

E como eu, pescoço travado querendo movimento
vagarosa cãibra no caibro
por dentro viga.

E doente
empapado, latejante
se alastrasse meu caldo
em tua tapera
catinga friinha.

E ouvisse trincos em meu crânio
perfurando ferrolhos
com os pregos que marca.

Entre conduítes
rebocando a Vida
que arromba o mofo,
a ser escora do gancho
que sustenta tua rede

de balanço.

(Allan da Rosa)

OBSzinha: São Jorge vai descer no mundão no jogo contra o Vaxxxxxxxxxco.

Fechooooooooooooooô

Vou colocar aqui um texto que escrevi depois da festona "Fechô no Gueto", que achei no meio dos papéis esquecidos.

" Pois é, as rezas deram certo. Não tinha nenhuma nuvem no céu, e de vez em quando até tinha fogo. A molecada não arredou o pé, podecrê, e a festa foi daquelas bonitas demais. É certo que foi meio sem jeito, aos trancos lá em cimão do barranco, a Kombi subia zuada. Mas o calor tava bravo machucando o lombo de quem brincava com insistência. Fizemos o improviso, no terreirão enlaçado de fitas coloridas. Enchemos a barriga de abrigo. O presente era cada par de olhinhos, cada um sabendo a lonjura da própria perna. Tinham muitos pares desses olhinhos, muitas vontades, novelos de linha enroscando nesse trecho de mundo calorento chamado Taboão. Os olhinhos fincavam, meio fechados por causa de tanta claridade. O pó sobe, a pipa sobe. Que nada, 37º? Muito mais! Um paredão de casas, morro, morro e sol. A mulherada ardia no meio do fumacê pra cima e pra baixo, gritando. Os donos dos olhinhos, ao contrário, faziam a farra. Não tem tempo ruim, porque não tem tempo perdido. Afinal, cada um é dono da sua própria artimanha. Na manha, a torneira gira, o povo aproxega. O povo gira, no meio do aguaceiro. Tudo brilhou naquele canto do Gueto: as bexigas, as Flores, as cercas, as malocas, a Vila toda. E o dia sem fim ainda iniciando, fazia a reverência pros nossos tataravós ao contrário".

Visse?


Hai Kai da TPM

Um dia após o outro
o correr de águas
seu olho roxo.

Eu mesma tenho não. Magina, euuuuuuuuuuuu? Mas conheço cada doida!


quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Canta para ver como é sublime, ó nêga


Ê trem bããããããão sô!

Povo, ainda tô naquelas, sem tempo nem jeito pra escrever...
é que a vida toma uns atalhos doidos e se a maré enche, eu vou com ela
nénão?

Mas aconselho ocês a ouvir uma música muito da bonita,

ALEGRIA TU TERÁS

Alegria tu terás
Canta para ver como é sublime, ó nêga
Tua paixão se desfaz
Não volta mais, não volta mais

A rosa que desfolhou
Foi por se achar cansada
De tanto fazer bonito
No romper da madrugada
Minha cabrocha
Meu divino redentor
Sou capaz de andar de rastro
Por causa do teu amor

(Alegria tu terás)
Alegria tu terás...

Fico triste, afinal
Você vai saber por quê
Para me livrar do mal
Que hoje eu fujo de você
Tanto faz eu trabalhar
Como ser rapaz vadio
A roupa que Deus me dá
É de acordo com o frio.
(Heitor dos Prazeres e João da Gente)

Certo? Tamos aí!

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Paz e Amor

Noite bonita, tudo em cima. Botecão lotado, e os migué caçando problema:

- Ei mina, vâmo trocar umas energias...

- Ôxi, eu não sou tomada não, fio.

Recortei e colei mêmo!

Pressa, pressa e mais pressa... mas é que tudo vai ficar batuta povo!
Cheguem junto, não fiquem aí panguando
Nós vamos pra lá:

"Povo lindo, povo inteligente,

hoje é o dia da Literatura na Semana de arte Moderna da Periferia, então pode esperar que o dia vai ser daquele jeito... Aliás, diga-se de passagem, tudo isso está acontecendo justamente pelo bom momento em que vive a literatura periférica e/ou marginal, como queiram.
À Tarde (17hs) teremos um debate na Casa de Cultura do M´boi mirim (Av. Inácio Dias da Silva, s/n Piraporinha), sobre "A produção literária da periferia" com Alessandro Buzo, Sacolinha, Elizandra, Eleilson e eu na mediação. (infs: 55143408)
À noite o bicho vai pegar no Sarau da Cooperifa, estão sendo preparadas várias surpresas para hipnotizar os convidados, nem nós nem você serão o mesmo depois noite, pode acreditar!
Estão sendo aguardados quinhentas pessoas, por conta disso o sarau vai começar mais cedo, 20hs, então, se quiser um bom lugar sugiro que levante agora e vá correndo para o bar do Zé Batidão conhecer a noite mais linda do ano, pois, se não sabem, já tem gente esperando o bar abrir.
Apesar de tudo, a periferia da zona sul nunca esteve tão colorida, não espere que ninguém te conte, vá você mesmo ver para crer.
Com calos nas mãos e o coração de veludo,
Sérgio Vaz
Antropófago da periferia"

Força na peruca rapaziada,
pega o "Jd. Ângela" no Largo da Batata,
pede pra descer na Igreja do Piraporinha e vai avistando a ladeira:
sobe-que-sobe e chega lá, no bar do Zé Batidão, na muvuca mesmo.

Tá água com açúcar já,
então inté.



segunda-feira, 5 de novembro de 2007

É primaveraaaaaaaa... te amuuuuuuuuuuuu




Moças e moços,
eu por aí ando me ocupando:
pingando com a chuva e ventando com o vento, que nem vocês. Outras coisas mais,
bonitas demais,
entre descaminhos, vergonhas, magrelices e bebedeiras (e uma vontade de viver tudo e não registrar nada!).

Deixo aqui poema da Lila e da Fêzinha, flores.

"Onde é que fica o lugar onde eu possa te encontrar fora da minha cabeça? Ou o amor será apenas isso mesmo? Essa coisa, consumida e devorada, martelando na cabeça.

Onde é que as pessoas se encontram pra dizer: “Não, não está tudo bem. ‘Tudo bem’ é apenas a resposta plausível da pressa. Ou da indiferença.”?

Em que parte é possível que não carreguemos sozinhos a realidade de não estarmos bem? E assim entendermos que não estar bem é o primeiro passo de um caminho novo. Onde podemos compartilhar os nossos silêncios. Inquietantes. Um lugar em que nos ensinem a aprender o silêncio dos estranhos, a entender os motivos dos que nada disseram, dos que agüentaram quietos, os motivos sem palavras, e as vidas que acontecem sem explicação. E que é o mesmo silêncio que a gente sente quando não sabe explicar esse nó no coração.

E o espaço-tempo do abraço, das cartas escritas a mão, dos suspiros..., e dos doces preparados por horas e horas, dos pensamentos sem conclusão? De ficarmos sentados, mirando, sem medir até quando, e sem dizer palavra.

Onde fica o lugar para podermos criar as nossas crianças sufocadas no peito, de perguntarmos se é com ‘s’ ou com ‘z’. O lugar das perguntas e respostas simples e dos poemas simples de amor:

“Um dia vi uma flor caída e triste

Lembrei de você”

Onde todos nos reunimos na mesa, antes do jantar, agradecemos, e ficamos pro café. ... O lugar da cozinha, da cozinheira. Do feijão cozinhando na lenha, o sol se pondo...

O lugar das verdades intuídas, construídas, vividas, confrontadas nos corpos. Cantadas em coros dissonantes. Das verdades significadas, trabalhadas, talhadas, repartidas. Da verdade-pão. Onde a história, a terra, a panela, reconheçam as nossas mãos. Onde as minhas mãos reconheçam as suas.

Se pudéssemos entender o milagre das nossas mãos. Da nossa luta muda e da mudança invisível porque profunda. A força da nossa deseducação. Do desafinado da nossa canção, das orações interrompidas pelo sono. Onde, sozinhos, nos confessamos. Trocamos confidências e sonhos.

Se entender é esse esforço de juntar, por que não nos entendemos juntos? Porque trocamos nossas idéias como quem troca produtos?

Quero um tempo em que a história signifique também o presente e o futuro. Que não nos venha embrulhada e pronta. Que seja as vísceras e o motor. Que seja em nós, o calor das ciências inventadas dos nossos avós, pra fugir dos açoites e dos insultos. A voz tremida e o suor.

Que os ouvidos não estejam à espera de um super-herói ou de um deus.

Onde fica o lugar onde atamos os nossos nós?"

(Liloca)




"Homem textura

olhos perscrutando

o que não se pode evitar:

inimaginável.

No campo imenso

a torre de petróleo me interroga

(sem que eu consiga dizer se é ela

ou o campo

quem está só):

- Em que consiste a masculinidade?

De súbito

na contra corrente

a janela refaz a tarde"

(Fêzinha)

terça-feira, 23 de outubro de 2007

Ceis tão preparado???

Clique na imagem pra ver a programação...


segunda-feira, 22 de outubro de 2007

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Parô pra Quentar

Colhi o sereno, guardei
foi tudo isso que vi e mais um pouco
Uma cidade perdida, num olho
outra vida habitada, dando vazão.
À noite tem roda de saia, às vésperas
de um imenso transtorno do tempo.
Engoli mais sereno, serenei.
O sereno acalenta a gente
até de manhã,
depois de manhã ninguém sabe.
O que eu sei é madrugada,
Por isso engulo sereno. Serenei.
À noite eu rodo a minha saia, às vésperas
de um imenso transtorno do tempo.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

FECHÔ!


Shows do Zafenate, Filhos da Terra, Ponta de Faca.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Mil Grau

Sou corintiana memo,
desde que eu nasci. Sabe porquê?
O trem é bãããããããããoo, pra não dizer que o baguio é loco!
Quem duvidou, desacreditou. É assim que a gente gosta.

Salve Timão, segue a tua saga!


OBS: 1x0.

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Quem não te conhece que te compre!

Ô bem, você é confusa demais. Tem duas muié.
Manhooooosa, faz birra, pirraça, chora né? Chora demais. Brava?

Muito amor. Muito amor.

Coração bom. Você tem um coração grande, mas cê num é boba não né fia? Sai de baixo com você hein, fia?

Os orixás... vai dar tudo certo! Faz isso, os erê.

Fia de Iemanjá, fia de Oxum.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Tem umas mortes que são mais bonitas que as outras...

Mais uma quarta-feira daquelas, molecada feliz saindo do Zé Batidão. No caminho longo da Zona Sul pra Zona Oeste, paramos na Estrada do Campo Limpo pra tomar mais uma saideira e comer um caldo de mocotó ali no boteco verde. O povo ia contando causo, enquanto eu fiava uma conversa com um menino-moço que veio das terras do outro lado do mar.

- Lá em Moçambique os homens podem casar com mais de uma mulher? E as treta?
- Ah, meu avó morreu de treta, por causa de ciúme.
- Eita porra...
- Ele casou com uma mulher assim... meio nova, e depois casou com outra mais velha. Ele morava no canto da roça, tinha uma casa. A mulher mais velha morava perto dele, do lado. A casa da mulher mais nova era no outro canto da roça, sendo que pra chegar lá meu avô passava antes na casa da mulher mais velha (que era minha avó). Pois bem, a moça nova começou então a brigar, porque ela dizia que tudo que era o bom ele deixava no meio do caminho, e o ruim ficava pra ela.
Um dia meu avô simplesmente morreu. No almoço resolveu comer um peixe, como fazia quase todo dia, e engasgou com um espinho que cruzou a garganta dele. Mas o espinho tinha veneno, e meu avô morreu inchado. Dias depois, eu não sei se você acredita nisso, em feitiçaria? Lá em casa tem um alambique, então dias depois a mulher nova pegou um galão de barro grande, a gente usa muito isso lá, pra levar cachaça na cabeça. Mas não sei o que aconteceu, no caminho o galão rachou em mil pedaços, e rachou a mulher inteirinha em mil pedaços também. E ela morreu. Dizem que foi vingança da minha avó...
- Eita porra.

sábado, 29 de setembro de 2007

Santo Forte

Chão de pedra, chão de areia, chão de tudo ou sem chão mesmo. Eu vou lá saber que chão? Tem pés, mulé? Pois, se joga. Tô pra vê ponta de mundo, biqueira, birosca, maloca, boteco, quebrada, goma, rolê, rôbada, colê, correria, organizada (vaaai Gaviões), que a gente não chegue junto. Então, se estamos aí inteiras é pra isso. Ouvindo um som com o mundão na frente, os zóio na malícia e o corpo na malemolência, um punhado de irmãos e amor no coração.

Ouve só: o santo é forte.

O tempo fechou usa da humildade, ou corre. O tempo fechou mais ainda, dá o bote. É essa a lição, a gente faz esse rolê por opção. Atrás dos sangue bom, num é dos "bonitinho" de plantão. Encenando a euforia, batendo ponto na alegria. Portões fechados, orgulho pago. Não, não. Bola pra frente, atrás vem muita gente. "Quem não segura o baque é piripaque". A gente enverga sim mas não quebra não, os nossos passos ofertamos. Unidas somos. Sem nada no bolso, sem garantia, sem segurança. Do nosso lado: os ventos, as águas
as gambiarras,
as estriquinagens e
as risadas.



Aí Lila, essa foi procê.

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Mas a lua tá gorda.

Pôvo,

eu tô numa correria danada, por isso não tem dado pra escrever nem caprichar. Minas, tamos aí, vamos botar fogo no baguio! Seguimos...

Vou colocar um poema que li no blog do Sérgio Vaz e gostei, certo? Ctrl C, Ctrl V.

Ah! Beonca, mudei lá as configurações, vc pode fazer comentário agora!



Eu apresento a página branca.


Contra:
Burocratas travestidos de poetas
Sem-graças travestidos de sérios
Anões travestidos de crianças
Complacentes travestidos de justos
Jingles travestidos de rock
Estórias travestidas de cinema
Chatos travestidos de coitados
Passivos travestidos de pacatos
Medo travestido de senso
Censores travestidos de sensores
Palavras travestidas de sentido
Palavras caladas travestidas de silêncio
Obscuros travestidos de complexos
Bois travestidos de touros
Fraquezas travestidas de virtudes
Bagaços travestidos de polpa
Bagos travestidos de cérebros
Celas travestidas de lares
Paisanas travestidos de drogados
Lobos travestidos de cordeiros
Pedantes travestidos de cultos
Egos travestidos de eros
Lerdos travestidos de zen
Burrice travestida de citações
água travestida de chuva
aquário travestido de tevê
água travestida de vinho
água solta apagando o afago do fogo
água mole sem pedra dura
água parada onde estagnam os impulsos
água que turva as lentes e enferruja as lâminas
água morna do bom gosto,
do bom senso e das boas intenções
insípida, amorfa, inodora, incolor
água que o comerciante esperto
coloca na garrafa para diluir o whisky
água onde não há seca
água onde não há sede
água em abundância
água em excesso
água em palavras.
Eu apresento a página branca.
A árvore sem sementes.
O vidro sem nada na frente.
Contra a água.


Arnaldo Antunes

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

...das crianças.


No colorido de seus sonhos o azul do céu sempre estava presente.
Dizia pra sua mãe, quando essa procurava um novo barraco pra morar, que o importante, era o tamanho do céu que a nova morada teria.
O tamanho do chão tanto fazia... até porque do chão de terra batida coberto de papelão não tinha como escapar, era assim e pronto. Sempre! Já o céu... Ah! O céu...
Quanto mais ladeira acima fosse, mais a menina gostava. Estaria mais perto da onde queria estar. Em corpo e sonhos.

Pequena que fosse, sabia encontrar a chuva antes dela virar desgraça.
Pequena que fosse, sabia quando era junho e julho. Ainda analfabeta aprendeu a ler o calendário pelos foguetes, balões e pipas.
Pequena que fosse, aprendeu o calendário lunar ... orientada pelos rasga-sacos, vira-latas e encoleirados da sua comunidade.

Quando sua mãe recebia doações que de porta em porta pedia no intervalo de suas faxinas, ela abria o saco ansiosa em busca de sapatos. Velhos, as vezes um pé só, outros que nem no pé de suas bonecas cabiam. Mas não se importava com o significado daquilo que a sociedade cheia de compaixão lhe doava, pois rapidamente o lixo deles virava mais um enfeite do céu de sua quebrada.
Arremessava para cima e nos fios, os sapatos enganchavam. Ela corria então para baixo do fio, e com o pescoço curvado em "180º" graus olhava o céu por baixo dos pisantes. Que bonito era o seu céu com fios, tênis amarrados no cadarço, fumaça, antenas, luzes e lajes.
Nos aviões, que os jornais tanto falavam, ela nunca pensou em estar dentro, muito menos em filas ficar. Eles eram também adorno do que na vida, pequena que fosse, tinha escolhido como paisagem.
Do céu e seus enfeites aprendeu a amar a rua/lua e o brinquedo/vento.

De ET's e Ovnis, pouco sabia. Medo? Que medo...
Ela só tinha medo de uma coisa, que os pipocos secos que davam, pro alto, pro lado, pro barraco, pro outro, lá abrissem buracos. Mas depois do estouro, procurava os rombos em cima de sua cabeça, e não encontrava. Nem as balas podia atingi-lo. E quando seu pai foi achado por uma bala que um homem de cinza soltou, aprendeu que na verdade uma nova estrela o céu
ganhava.
Essa segredo foi com São Jorge que ela compartilhou...

(Bia Cactus)

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Aprendi a colocar imagem!


Festa de 97 anos do Corinthians! Dá pra colocar fotos e essas tranqueiras, dahora.

Miguelando no trampo, levando a vida, comendo amora.

Escolha



Eu te amo como um colibri resistente
incansável beija-flor que sou
batedora renitente de asas
viciada no mel que me dás depois que atravesso o deserto.
Pingas na minha boca umas gotas poucas
do que nem é uma vacina.
Eu uma mulher, uma ave, uma menina…
Assim chacinas o meu tempo de eremita:
quebras a bengala onde me apoiei, rasgas minhas meias
as que vestiram meus pés
quando caminhei as areias.

Eu te amo como quem esquece tudo
diante de um beijo:
as inúmeras horas desbeijadas
os terríveis desabraços
os dolorosos desencaixes
que meu corpo sofreu longe do seu.
Elejo sempre o encontro
Ele é o ponto do crochê.
Penélope invertida
nada começo de novo
nada desmancho
nada volto

Teço um novo tecido de amor eterno
a cada olhar seu de afeto
não ligo para nada que doeu.
Só para o que deixou de doer tenho olhos.
Cega do infortúnio
pesco os peixes dos nossos encaixes
pesco as gozadas
as confissões de amor
as palavras fundas de prazer
as esculturas astecas que nos fixam
na história dos dias

Eu te amo.
De todos os nossos montes
fico com as encostas
De todas as nossas indagações
fico com as respostas
De todas as nossas destilairias
fico com as alegrias
De todos os nossos natais
fico com as bonecas
De todos os nossos cardumes
as moquecas.
(elisa lucinda)

Poesia bonita, rapaz.

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Causo

O Luís, meu chefe, descobriu que tem um outro Luís com o mesmo sobrenome trabalhando no Dieese, e ficou muito puto pela injustiça de Deus. Tanto fez, que descobriu o telefone do dito cujo e resolveu ligar. Discou o número que era interurbano, e pouco depois deixou o telefone cair, com cara de bobo:

- Eu atendi!

4 a 11 novembro nas bordas

Manifesto da Antropofagia Periférica

A Periferia nos une pelo amor, pela dor e pela cor. Dos becos e vielas há de vir a voz que grita contra o silêncio que nos pune. Eis que surge das ladeiras um povo lindo e inteligente galopando contra o passado. A favor de um futuro limpo, para todos os brasileiros.
A favor de um subúrbio que clama por arte e cultura, e universidade para a diversidade. Agogôs e tamborins acompanhados de violinos, só depois da aula.
Contra a arte patrocinada pelos que corrompem a liberdade de opção. Contra a arte fabricada para destruir o senso crítico, a emoção e a sensibilidade que nasce da múltipla escolha.
A Arte que liberta não pode vir da mão que escraviza.
A favor do batuque da cozinha que nasce na cozinha e sinhá não quer. Da poesia periférica que brota na porta do bar.
Do teatro que não vem do “ter ou não ter...”. Do cinema real que transmite ilusão.
Das Artes Plásticas, que, de concreto, querem substituir os barracos de madeira.
Da Dança que desafoga no lago dos cisnes.
Da Música que não embala os adormecidos.
Da Literatura das ruas despertando nas calçadas.
A Periferia unida, no centro de todas as coisas.
Contra o racismo, a intolerância e as injustiças sociais das quais a arte vigente não fala.
Contra o artista surdo-mudo e a letra que não fala.
É preciso sugar da arte um novo tipo de artista: o artista-cidadão. Aquele que na sua arte não revoluciona o mundo, mas também não compactua com a mediocridade que imbeciliza um povo desprovido de oportunidades. Um artista a serviço da comunidade, do país. Que, armado da verdade, por si só exercita a revolução.
Contra a arte domingueira que defeca em nossa sala e nos hipnotiza no colo da poltrona.
Contra a barbárie que é a falta de bibliotecas, cinemas, museus, teatros e espaços para o acesso à produção cultural.
Contra reis e rainhas do castelo globalizado e quadril avantajado.
Contra o capital que ignora o interior a favor do exterior. Miami pra eles? “Me ame pra nós!”.
Contra os carrascos e as vítimas do sistema.
Contra os covardes e eruditos de aquário.
Contra o artista serviçal escravo da vaidade.
Contra os vampiros das verbas públicas e arte privada.
A Arte que liberta não pode vir da mão que escraviza.
Por uma Periferia que nos une pelo amor, pela dor e pela cor.


É TUDO NOSSO!
Sérgio Vaz
Poeta da Periferia


Dêem uma passada nesse link:

http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG79089-6014-487,00.html




terça-feira, 18 de setembro de 2007

Parindo Amanhãs

Vontade de um terreiro mocambado de palmeiras
Vontade de reler as letras da história
Escrita no curso das veias
De uma história mais guerreira, pulsante.

Um sentido sentido às palavras
Saber de que boca as verdades caem.
Saber quais verdades é emboscada da boca do inimigo e
das verdades escondidas nos cantos,
Mudas no canto da boca.

Coragem pra colorir o branco pálido da página,
E pra morar tanto tempo no canto invisível da página
Lido nos entres, nos vãos, nos saberes não escritos.
Lido apenas pelos analfabetos em seus delírios lúcidos.

A força de aproveitar as vértebras, os ventres.
O que nos ergue e o que nos infinita
O verde-maduro de nossas sementes.
O desvio inesperado de nossas vertentes. Inverter.

Detonar o muro velho que divide e verga.
O muro que envergonha.
Descobrir-se África no mapa do corpo.
Onde fica Angola, onde fica o Congo
Defrontar-se com intangíveis fronteiras das áfricas que somos.

Parir novos pares, novos plurales, novos pilares.
As vozes contrárias do hoje e do dentro em contrações desejando ser.
Ser é saber-se. Ser mais é saber-se parte.
Vontade de parir novos palmares...

Um novo ponto de partida,
Que nos guie e nos caminhe,
Que nos leve a nós mesmos.
Que nos leve a criar ao invés de ser criados.

A vez de nascer novas vias de verdades.
Onde me vejo e me vôo.
Pra morrer esse viés que nos enverga.
Pra versar o versus, dos versos... O inverso.
Que é quando me descubro escravo que me liberto.
Que é quando me descubro escravo que me liberto.

(Lila)

VIDA LOKA - Racionais


Meu negócinho de MP3 pifou, só sobrou essas músicas. Rodando o dia todo!

...

Aos parceiros tenho a oferecer minha presença,
Talvez até confusa, mas Real e Intensa,
Meu melhor Marvin Gaye, sabadão na Marginal,
O que será, será, é nóis vamo até o final,
Liga eu, liga nóis, onde preciso for,
No Paraíso ou no dia do Juízo Pastor,
E liga eu, e os irmão,
É o ponto que eu peço, favela, Fundão,
Imortal nos meus versos,
VIDA LOKA.

...

É só questão de tempo, o fim do sofrimento,
Um brinde pros guerreiro, zé povinho eu lamento,
Vermes que só fazem peso na terra.
Tira o zóio.
Tira o zóio, vê se me erra,
Eu durmo pronto pra guerra,
E eu não era assim, eu tenho ódio,
E sei que é mau pra mim,
Fazer o que se é assim,
Vida loka cabulosa,
O cheiro é de pólvora,
E eu prefiro rosas.
E eu que...e eu que...
Sempre quis um lugar,
Gramado e limpo, assim, verde como o mar,
Cercas brancas, uma seringueira com balança,
Disbicando pipa, cercado de criança...
"How...how Brown
Acorda sangue bom,
Aqui é Capão Redondo, tru
Não pokemon,
Zona sul é o invés, é stress concentrado,
Um coração ferido, por metro quadrado..."
Quanto, mais tempo eu vou resistir,
Pior que eu já vi meu lado bom na U.T.I,
Meu anjo do perdão foi bom,
Mas tá fraco,
Culpa dos imundo, do espírito opaco.
Eu queria ter, pra testar e vê,
Um malote, com glória, fama,
Embrulhado em pacote,
Se é isso que cêis quer,
Vem pegar.
Jogar num rio de merda e ver vários pular

33 II

- Se vira nêga!

Alta, minha estrela-guia fisga o canto da boca. Pôrra, fiz merda. Que bom. A rua começa a murchar nessa escuridão, vai soltando as rédeas dos carros, das casas, dos postes de iluminação. Ei Lua, encaminha os loucos pras suas vielas, cuida bem delas (a Lua sabe é desse pôvo). Me enrosquei de novo, no som amistoso daquela que de um lado oferece a flor, do outro a espadela. Como dizia o poeta: mas aqui ninguém amarela.
Num tem essa de ficar passando um pano, né mano? A questão é uma vírgula escondida que ninguém atravessa sem antes bater cabeça, em encruzilhada em beira de esquina ou em qualquer quebrada. Essa vírgula é o poço da dádiva, vai esmiuçando, botando fogo nos óio, ardendo, temperando, e vai que dá a liga, no profundo desespero consciente, quando a gente toma posse de fora de dentro pra sempre. Fiz merda, eita coisa boa sô!

A rua desafivela o cinto em que percorro com a minha magrela, a noite é baixa pra eu tocar nela, chorando um choro boniiiiiiiito, firme e infinito.

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Nóis sem nóis n'é nóis

Minha mãe me ensinou que existe o fundamental, e você tem que se manter firmão o tempo inteiro para que a vida não vá pareando a batida do peito com a batida do relógio. De vez em quando, enquanto assistia aula no primário (salve Amorim Lima!), a inspetora de alunos mandava me chamar. Sempre que acontece isso, é por que ocorreu alguma coisa grave na família, então eu descia a escada com o coração acelerado. No fim do corredor em que a molecada costumava tomar advertência, lá estava ela, com um sorriso gigante e três bolinhas de açúcar. Toma o seu remédio e esse beijo. Bora dar uma volta. Olha essa flor, parece o seu nariz! Isso se chama tatu-bolinha. Ô fiote, que cê tá aprendendo hoje?

Só os fundamento.

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Para a minha Batchan

Monte Fuji e Nagasaki, águas eternas de
roça e roçado, arroz e incenso
navios, promessas, cuidado.
mãos pretas de terra
mãos de fumaça
mãos secas de frio,
principalmente suas mãos.

Bordam as beiras de um mundo invisível,
mítico, cheio de filhos

de olhos rasgados.

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Timariinha do Tivete?

Quem conhece minha vó, Mariinha, nunca se esquece
Muito menos do vô Vete

Meu vô conta que eles se conheceram lá pelos idos de 1930, ou 40
na Picada das Candeias do Sertão de Minas Gerais,
quando o Vete pescava no corguinho.
De repente, ele sentiu uma fisgada tão, mas tão forte que até caiu.
Puxou o bicho e quando viu, era a Maria lá.

Foi assim que a família Trexeira começou.

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Chavão abre Porta Grande

Como já dizia o véio e bão Itamar


De repente
O amor de sempre não era mais suficiente
O amor de sempre de repente não era mais suficiente

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Um Reino

Mulher, Potência
Austeridade prenunciando boas idéias
Pensamento vagabundo que corre todo canto
Dando a cara, os joelhos, os ombros pra bater...
Enlaçando, fundando mundos e fundos,
acabando com tudo.
Seduzindo, afastando.
Eternizando, cabendo na palma das mãos
Jogando tijolos nas ilusões, nunca nunca imaculada.
Maculando, provendo reinos.
Delicadeza: tudo que é feito de força domada,
escondida e disfarçada.
E quando baixa a guarda se arma.
...
Acordei florindo, e me esparramando,
peguei o ônibus lotado
sem xororô
Buscando uma cor, ficando sossegada, entendendo.

sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Amanhecimento


De tanta noite que dormi contigo
no sono acordado dos amores
de tudo que desembocamos em amanhecimento
a aurora acabou por virar processo.
Mesmo agora
quando nossos poentes se acumulam
quando nossos destinos se torturam
no acaso ocaso das escolhas
as ternas folhas roçam
a dura parede.
nossa sede se esconde
atrás do tronco da árvore
e geme muda de modo a
só nós ouvirmos.
Vai assim seguindo o desfile das tentativas de nãos
o pio de todas as asneiras
todas as besteiras se acumulam em vão ao pé da montanha
para um dia partirem em revoada.
Ainda que nos anoiteça
tem manhã nessa invernada
Violões, canções, invenções de alvorada...
Ninguém repara,
nossa noite está acostumada.
(elisa lucinda)

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

O Tempo do Homem que Monopolizou o Mergulho


Tinha esse país e tinha um grande Homem, e estava tudo correto. No começo da manhã, quando o sol rosado despontava, uma grande fila começava a se formar na frente do portão de metal, que abria pontualmente às 06:00 horas. A fila começava a se arrastar, enorme que era, pelos quarteirões rodeados de cachorros e cachorros quentes, que se aproveitavam dos lixos humanos proliferando. A carreira se agigantava ao longo do dia, e os ladrilhos pisados da calçada iam endurecendo debaixo do falatório, da tagarelice, da impaciência dos homens. Muitos deles chegavam ainda pela noite, sem estrelas, e esperavam entre o ar mais frio da madrugada uma dianteira. Esperavam nunca mais esperar, no meio de cobertores velhos e sapatos, marmitas e álcool, palavras trocadas sem gosto, sal, sono. Um passo à frente, o portão aberto espera os homens com calma, e com calma todos são revistados entre os cabelos, no peito e costela, debaixo dos braços, genitália, pernas e pés. De frente e de trás, a confirmação da entrada é a garantia de nenhuma arma branca, gente preta ou qualquer perfurante. Inalantes e líquidos também são proibidos, mas podem ser retirados na saída, pagas as devidas taxas.


***

Quando andava pelas pedras que rodeavam a praia de sua infância, o Menino sabia muito bem onde pisar. O mar ali era muito recortado, e de longe não se podia ver muito bem o que era menino, o que era bloco e pontas de pedra. O Menino não se mexia, perdido entre a linha da onda e da brisa fresca, e assim passava, um após o outro, os dias. De vez em quando um pássaro-agulha costurava a água, buscando um peixe pra sumir no azul. Mas certa vez, como nunca antes, o Menino levantou, puxou um naco de ar e pulou, de cabeça, pra sumir na maré.


***

O local é um galpão muito alto, feito com pedras de granito cinza, e era o único lugar desse país onde todos podiam entrar na fila e esperar tanto, por algo tão esperado. Por isso que todos esperam.
O Homem teve realmente uma bela idéia, e foi belo quando, em meio às lágrimas descobriu o sentido de tudo, e quis mostrar à Humanidade como isso era. Começou muito de pequeno, e com muito suor, sangue e estudo, conseguiu erguer um quartinho. Dentro desse quarto se dedicava o dia todo a aperfeiçoar o seu mecanismo, que abria à experimentação nos fins-de-semana. Como se fosse obra de Deus, ou do Diabo mesmo, um ano depois conseguiu um terreno perto do Centro da cidade, onde suou alguns anos mais de sua vida para erguer quatro paredes que deram lugar a uma sólida estrutura onde ninguém, ninguém jamais pôde sair como havia entrado.
Construiu um sonho e o ofertou a preços módicos, a todos. A plataforma ocupava o centro do galpão e tinha muitos e muitos metros medidos, tanto é que se demorava vinte minutos a subida. Lá, duas mulheres muito bonitas e peitudas sorriam e amarravam os pés dos homens bem forte. O indivíduo andava até o fim da plataforma e se deixava cair com os braços cruzados no peito, os olhos bem abertos, e assim a fila corria. Quem chegava lá embaixo ficava a alguns milímetros da superfície da água, contida dentro de uma piscina redonda. Sorriam.
A fila caminhava passo a passo e cada homem repetia os gestos necessários, com uma sanha de medo e alucinação dentro da barriga. Enquanto esperavam, ouviam mais uma vez a história do Menino, contada muitas e muitas vezes desde todas as infâncias. E a história aqui ainda se repetia no meio de grande comoção. E todos podiam sentir pela primeira vez o ar frio lá de cima da plataforma, passeando entre os cabelos na queda com os olhos abertos, a respiração presa e o coração sufocado, frente a frente com toda a água e tão perto dela. Dois centímetros do nariz, o reflexo da água olhava dentro dos olhos de quem encarava. O que viam? E, pendurados pelos pés, os homens viravam pêndulos de um tempo que só parava um pouco, pra continuar sempre correto.
Dizem que certa vez um homem do interior, sem querer, deixou cair o relógio de pulso na água e endoidou, pois teve um visão.

domingo, 24 de junho de 2007

Cai-Cai

Procurando estrelas

encontrei

um seixo, um chão no queixo.
Hora em que ela encaixotava a cara, o bar ia fechando.


As luzes ainda caíam muito sem-vergonha, indo e voltando e
sombreando os vultos, carregando as moscas. Pelo chão, os cacos quebrados se abriam piscando pras mesas, ruminando debaixo de um teto que dorme toda noite. Enquanto isso, os copos gostavam de ficar rodando em volta do ventilador.O bar ia fechar.


De vez em quando, quase sempre em noites quentes, um homem muito antigo conseguia um lugar para sentar, se embebedar nesses olhos...

Mas no dia seguinte, era sempre a mesma sede, coberta de pó e sem teco de sombra pra fugir do sol. Sede cor de amarelo, a ponto de ver o próprio corpo virando
água salgada.


Porre de mágoa.

33

Fechou a porta de saída como quem esvazia. Esvaía umas idéias madurando que cresciam nos últimos dias, saindo que nem espinhas e pipocando pelo rosto mesmo. O sentimento era de estupefação.

- Eu pego esse maldito!


Todo esse roteiro, lágrima sobre um tanto de tranqueira, roupas véias e pó, mofo e cachorro molhado, baguios de toda maneira, caraminholas e minhocas, juntas num caldo bem forte que é o pessimismo da moça, feita perfeita para amar! Ugh! Saiu por aí precisando andar, afinal, já dizia o casal moderno, agora que não é mais só precisa se encontrar. Como se jogasse um esconde-esconde consigo mesma, procurou caçar uns problemas por aí. Arranjou o jeito de dar nó em cobra, se afobou demais e parou de novo pra pensar com força. Uns negócios carcomendo, nada muito claro aparecendo, isso juntando com aquilo e uns nós amarrando tudo e mais. Tenta:


- Vou fazer a lista das queixas, tudo dando pitaco, o copo meio vazio, a cama desarrumada, puta moleque chato, reclama de tudo, invade tudo, fica com cara de bosta, não sabe cozinhar, não sabe tocar nada, anda torto, não fala que eu sou bonita, não gosta de sair de casa, eu tenho que ficar agradando, eu tenho que ficar sofrendo, se ele tá aqui é meio ruim, se vai embora é ruim inteiro, eu não posso nem ficar triste, tenho vergonha do meu cabelo, se eu baixo a guarda ele repara fica falando, mas o pior é quando pára! Eu não sou mais nem apaixonada, nem poesia eu faço mais. Minha alegria ficou dura, ela demora um tempo: misturou com a água que eu bebo, se não me esforço nem percebo. A lista das queixas continua, o copo meio vazio. Se é meio vazio eu deito. Eu paro. Tanta coisa pra pensar. E quanto mais eu penso mais fica embaçado. Vou acabar com esse negócio. Não tá indo, não tá caminhando...


Mas a constatação vai virando cimento, que a gente cada vez põe mais areia. E toda pessoa sabe que a razão tem jeitos de ser cruel, então o cimento vai cimentando, unindo os blocos da menina.

Constatação...


O vento frio entra no nariz e pela nuca, saudade do sol, pouca blusa. O frio dá raiva, e a raiva agora é de tudo ser tão errado, como se todo o ódio se juntasse bem ácido num ponto da boca do estômago, desvirginando um conformismo doido porque raivoso. Sentiu que nada era imune. As casas ao redor, todas magoadas, baixavam a cabeça: sim senhora.


- Que cê ta olhando?


A rua humilhada, tudo esmaecia, a noite desmaiava. Já viu uma mulher braba?

Tudo em volta conspirava, chegava no pé do ouvido e soltava um urro.

- Filho da mãe descabacento! Vou lá porque isso não tá certo! Tem que acabar!


Já estava na rua detrás, foi fácil mudar a rota pela viela, andar mais um pouco, a mil. A mina com a boca seca chegou na porta do amado, pobre coitado.


- 33, sou eu, abre aí pra gente conversar.


-Entra, que foi?


- Nhé.


Deu um beijo jogado, nem precisava.


A sala rodava em volta dos dois. O único som era o estalar dos dedos, a novela das oito.


- Vou dizer logo porque eu não sou molenga e falo o que penso!


- Tô ouvindo!


- Ó, meu mundo tá bagunçado, eu gosto muito demais de você, mas não tô agüentando, é difícil ficar junto, não sei o que vai ser (chôro).


Um sorriso tinge a boca do rapaz, que quase suspira de alívio:



- Se vira, nêga!